Fortaleza, 14 de março de 2017.
Ainda
consternados, buscamos manter-nos serenos, sem qualquer resignação, diante da injustiça
que sofremos ao não sermos contemplados com absolutamente nenhuma bolsa de
extensão, quando, até então, tínhamos três.
Desejamos argumentar
que, não pesa qualquer queixa contra professores, estudantes ou profissionais
que integram o NUCED. Todos os professores do Nuced que integram o corpo
docente da UFC se dedicam integralmente a esta instituição; nunca deixaram de
executar suas obrigações acadêmicas sem justificativa; não têm qualquer acusação
de desrespeito a estudantes, colegas ou funcionários administrativos; dedicam-se
ao NUCED, que é um Programa de Extensão, para além das horas oficialmente registradas;
jamais deixaram bolsistas ou integrantes do NUCED inteiramente ao desamparo. Em
relação ao NUCED, que já completa 13 anos de existência, também não pesa
qualquer acusação que lhe deixe ao arbítrio de punições por parte de órgãos
colegiados de nossa Universidade.
Fizemos um
relatório extenso sobre nossas atividades anuais, onde cada palavra lá colocada
foi impressa sob a égide da "parresía"
grega, que significa, como nos ensinou Foucault: "tudo a dizer", com
franqueza, liberdade e abertura. Absolutamente tudo que consta nesse relatório é
"verdadeiro", sem seu maior inimigo que é a lisonja, ou louvor a si
próprio.
Assim, a
indignação nos toma por inteiro. Desejamos saber o porquê de termos sido punidos,
sem o "espirito" de vingança que também é inimigo da justiça e da
liberdade. Não acatamos situações de injustiça, tão presentes em nosso
trabalho, seja com jovens de periferia, seja com as profissionais do sexo, e
assim procedemos em relação a nós mesmos. Desejamos saber os motivos pelos
quais não fomos considerados um projeto de extensão, já que, se fosse diferente,
seríamos contemplados com a possibilidade de sua continuidade, favorecida com o
aporte de bolsas, para quem se dedica as atividades de Redução de Danos (RD) e
cuidado em saúde, inclusive em finais de semana, como as estudantes que antes
tinham essa contrapartida por sua dedicação qualificada.
Começamos um
trabalho inédito no curso de Psicologia de cuidado sistemático a pessoas que
vivem nas ruas. Ademais, iniciamos também, desde quando a saudosa professora Fátima
Sena estava à frente do NUCED, as atividades de Redução de Danos na UFC e
periferias empobrecidas de Fortaleza, levando cuidado ao invés de repressão e
proibicionismo. Articulamos quatro disciplinas com às práticas de extensão do
NUCED. Estamos articulando nove projetos de pesquisa no NUCED, sendo destes, cinco
de pós-graduação (04 de doutorado e 01 de mestrado), três monografias de
graduação, mais um projeto sem vinculação a graduação ou pós. Mantemos uma
página no Facebook e um Blog com diversas informações sobre o tema drogas, este
último com mais de dezesseis mil acessos. Fazemos há um ano e meio oficinas de
cuidado em saúde, (drogas e sexualidade), com calouros de Psicologia e este semestre
também incluímos nessa ação os cursos de História e Comunicação Social. Fazemos
também diversas atividades relacionadas a estratégias de Redução de Danos nos
equipamentos da Prefeitura de Fortaleza destinado a jovens, os CUCAS. Fazemos ações
juntos a profissionais do sexo na Barra do Ceará. Ainda realizamos várias
outras atividades que estão descritas em nosso blog (http://nuced.blogspot.com.br/).
Se todas essas ações
que descrevemos em detalhes no relatório anual e no formulário de solicitação
de bolsas, do modo mais intenso e verdadeiro possível, não merecem qualquer
apoio, julgamos que a Universidade deveria rever o que seja Extensão ou apontar
os motivos pelos quais nos exclui de seu rol de projetos reconhecidos e
apoiados.
De nossa parte,
temos certeza que estamos “sujando” as nossas mãos na história para mudar, de
modo localizado, sem ilusões utópicas, situações graves de saúde enfrentadas
por populações das periferias de Fortaleza, e também, nos dedicando para que a
formação de psicólogos e psicólogas, acompanhem o compromisso ético de se
dedicarem ao cuidado de quem é incluído na exclusão. Aliás, sabe-se que o termo
“Profissão” concubina-se com o termo “Professor”. Ambos advêm do verbo latino
“profere”, que significa: “trazer para a frente”, “declarar”, “apresentar”, em
última análise, “proferir algo”. Sobretudo, o que proferimos é essa dedicação,
ao mesmo tempo, exaustiva e prazerosa, ou, como nos ensinou Nietzsche, “tragicômica”,
de denunciar regimes de disciplina e controle que impedem a vida de fluir
libertariamente.
O perfil de
estudantes do curso de Psicologia vem mudando nos últimos dez anos. Antes
víamos nas salas uma maioria de graduandos de classes médias ou altas. Agora,
quando se abriram as portas da Psicologia para a formação de pessoas que antes
eram apenas aceitas na condição de “pacientes” que favoreciam o treino de
estudantes, temos de também mudar as nossas práticas e apoiar todos e todas
estudantes para que cheguem dignamente ao final do curso. Como psicólogos, o
cuidado se faz nos campos de estágio e também nas salas de aula, nos corredores
do curso. Somos responsáveis por cada um ou uma que entra nesse curso, tanto
pela sua formação quanto pela sua permanência nele. Assim pensamos.
Não deixaremos
de nos manifestar ou abandonaremos nossas ações, mesmo com mais essa
dificuldade que nos é imposta. Sempre saberemos buscar novas e fascinantes
propostas para continuarmos nossas ações, por conta desses estudantes e demais
jovens que participam de nossas ações, a maioria tendo de inventar formas criativas
de viver por conta das situações de exclusão a que são submetidos desde o
nascimento.
Saudações
libertárias,
Núcleo de Estudos sobre Drogas – NUCED.
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