segunda-feira, 27 de março de 2017

NOTA PÚBLICA SOBRE CONCESSÕES DE BOLSAS








                                            
Fortaleza, 14 de março de 2017.

Ainda consternados, buscamos manter-nos serenos, sem qualquer resignação, diante da injustiça que sofremos ao não sermos contemplados com absolutamente nenhuma bolsa de extensão, quando, até então, tínhamos três.
Desejamos argumentar que, não pesa qualquer queixa contra professores, estudantes ou profissionais que integram o NUCED. Todos os professores do Nuced que integram o corpo docente da UFC se dedicam integralmente a esta instituição; nunca deixaram de executar suas obrigações acadêmicas sem justificativa; não têm qualquer acusação de desrespeito a estudantes, colegas ou funcionários administrativos; dedicam-se ao NUCED, que é um Programa de Extensão, para além das horas oficialmente registradas; jamais deixaram bolsistas ou integrantes do NUCED inteiramente ao desamparo. Em relação ao NUCED, que já completa 13 anos de existência, também não pesa qualquer acusação que lhe deixe ao arbítrio de punições por parte de órgãos colegiados de nossa Universidade.
Fizemos um relatório extenso sobre nossas atividades anuais, onde cada palavra lá colocada foi impressa sob a égide da "parresía" grega, que significa, como nos ensinou Foucault: "tudo a dizer", com franqueza, liberdade e abertura. Absolutamente tudo que consta nesse relatório é "verdadeiro", sem seu maior inimigo que é a lisonja, ou louvor a si próprio.
Assim, a indignação nos toma por inteiro. Desejamos saber o porquê de termos sido punidos, sem o "espirito" de vingança que também é inimigo da justiça e da liberdade. Não acatamos situações de injustiça, tão presentes em nosso trabalho, seja com jovens de periferia, seja com as profissionais do sexo, e assim procedemos em relação a nós mesmos. Desejamos saber os motivos pelos quais não fomos considerados um projeto de extensão, já que, se fosse diferente, seríamos contemplados com a possibilidade de sua continuidade, favorecida com o aporte de bolsas, para quem se dedica as atividades de Redução de Danos (RD) e cuidado em saúde, inclusive em finais de semana, como as estudantes que antes tinham essa contrapartida por sua dedicação qualificada.
Começamos um trabalho inédito no curso de Psicologia de cuidado sistemático a pessoas que vivem nas ruas. Ademais, iniciamos também, desde quando a saudosa professora Fátima Sena estava à frente do NUCED, as atividades de Redução de Danos na UFC e periferias empobrecidas de Fortaleza, levando cuidado ao invés de repressão e proibicionismo. Articulamos quatro disciplinas com às práticas de extensão do NUCED. Estamos articulando nove projetos de pesquisa no NUCED, sendo destes, cinco de pós-graduação (04 de doutorado e 01 de mestrado), três monografias de graduação, mais um projeto sem vinculação a graduação ou pós. Mantemos uma página no Facebook e um Blog com diversas informações sobre o tema drogas, este último com mais de dezesseis mil acessos. Fazemos há um ano e meio oficinas de cuidado em saúde, (drogas e sexualidade), com calouros de Psicologia e este semestre também incluímos nessa ação os cursos de História e Comunicação Social. Fazemos também diversas atividades relacionadas a estratégias de Redução de Danos nos equipamentos da Prefeitura de Fortaleza destinado a jovens, os CUCAS. Fazemos ações juntos a profissionais do sexo na Barra do Ceará. Ainda realizamos várias outras atividades que estão descritas em nosso blog (http://nuced.blogspot.com.br/).
Se todas essas ações que descrevemos em detalhes no relatório anual e no formulário de solicitação de bolsas, do modo mais intenso e verdadeiro possível, não merecem qualquer apoio, julgamos que a Universidade deveria rever o que seja Extensão ou apontar os motivos pelos quais nos exclui de seu rol de projetos reconhecidos e apoiados.
De nossa parte, temos certeza que estamos “sujando” as nossas mãos na história para mudar, de modo localizado, sem ilusões utópicas, situações graves de saúde enfrentadas por populações das periferias de Fortaleza, e também, nos dedicando para que a formação de psicólogos e psicólogas, acompanhem o compromisso ético de se dedicarem ao cuidado de quem é incluído na exclusão. Aliás, sabe-se que o termo “Profissão” concubina-se com o termo “Professor”. Ambos advêm do verbo latino “profere”, que significa: “trazer para a frente”, “declarar”, “apresentar”, em última análise, “proferir algo”. Sobretudo, o que proferimos é essa dedicação, ao mesmo tempo, exaustiva e prazerosa, ou, como nos ensinou Nietzsche, “tragicômica”, de denunciar regimes de disciplina e controle que impedem a vida de fluir libertariamente.
O perfil de estudantes do curso de Psicologia vem mudando nos últimos dez anos. Antes víamos nas salas uma maioria de graduandos de classes médias ou altas. Agora, quando se abriram as portas da Psicologia para a formação de pessoas que antes eram apenas aceitas na condição de “pacientes” que favoreciam o treino de estudantes, temos de também mudar as nossas práticas e apoiar todos e todas estudantes para que cheguem dignamente ao final do curso. Como psicólogos, o cuidado se faz nos campos de estágio e também nas salas de aula, nos corredores do curso. Somos responsáveis por cada um ou uma que entra nesse curso, tanto pela sua formação quanto pela sua permanência nele. Assim pensamos.  
Não deixaremos de nos manifestar ou abandonaremos nossas ações, mesmo com mais essa dificuldade que nos é imposta. Sempre saberemos buscar novas e fascinantes propostas para continuarmos nossas ações, por conta desses estudantes e demais jovens que participam de nossas ações, a maioria tendo de inventar formas criativas de viver por conta das situações de exclusão a que são submetidos desde o nascimento.
Saudações libertárias,


Núcleo de Estudos sobre Drogas – NUCED.

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