Acordei sábado bem cedo e tinha três compromissos para o mesmo turno da
manhã. Isso porque muitas vezes esqueço das coisas quando não registro na minha
agenda. Acabo olhando para a agenda vazia e pensando “esse dia está livre,
posso marcar meu compromisso para ele”. E assim eu acabo marcando diversos
compromissos para uma mesma data, sem fazer nenhum registro sobre. Apesar
disso, escolhi sem dúvidas o meu destino: a I Parada do Orgulho Louco, uma
manifestação que teve sua concentração na Estátua da Iracema Guardiã, na Praia
de Iracema (Fortaleza, CE), e seguiu até o Aterrinho da Praia de Iracema. No
aterrinho, um palco nos esperava com apresentações artísticas de bandas e um
espaço de tribuna livre para que pacientes da Rede de Atenção Psicossocial,
profissionais e militantes pela causa da Luta Anti-manicomial pudessem se
manifestar, passando seus conhecimentos e os porquês da sua luta para outras
pessoas que ali estavam curtindo uma praia em um sábado de sol maravilhoso. É
claro, tudo isso também foi montado para que pudéssemos nos divertir - e o dia
não poderia ter sido mais divertido. Crianças, jovens, adultos e idosos
conversavam, dançavam, divertiam-se. Clairton, artista plástico, vendia sua
arte, enquanto jovens comiam um bolo e outros dançavam forró. O dia parecia
fácil de se viver, aqueles dias gostosos de levantar da cama. A sensação é de
que há tempos um dia não era fácil assim.
Ali estava eu diante dessa construção conjunta que proporcionou tantos
sorrisos e cuidado, desde o ato de passar protetor solar em pessoas
desconhecidas que estavam ali se queimando, até dançar forró, quadrilha,
abraçar o outro, desabafar e ser ouvido, receber um copo d’água, cantar uma
música. Um espaço feito para expressividade, um momento que envolveu luta e
cuidado. Ali se reuniram pessoas que não tinha medo de ser o que eram, e que se
colocaram ali, afirmando ser quem eram, com orgulho, antimanicomiais e, sim,
loucos. Fora da norma se assim se é, fora da norma se assim desejam. Como dizia
Belchior, citado em cartazes trazidos na manifestação, “a minha alucinação é
suportar o dia-a-dia”, e penso, certamente, que para suportar, é que produzimos
espaços como estes, de cuidado, expressão, de poder ser o que se é sem
julgamentos (ou com menos deles!).
Nós somos anti-manicomiais porque somos pela liberdade, pela
diversidade, pela diferença. Não tema o que é diferente. Não nascemos para
viver no isolamento. Repetimos: trancar não é tratar. Trancar não é cuidar!
Lutamos por um cuidado ético e uma saúde pública de qualidade e, por
isso, somos contra as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas
Diretrizes da Política Nacional sobre Drogas (nota técnica 11/2019) e contra o
governo Bolsonaro e as suas medidas que vão na direção oposta da Reforma
Psiquiátrica (Lei 10.216/2001) e do respeito às diferenças.
Ainda lembrando Belchior, “amar e mudar as coisas me interessa mais”.
Manicômios? Nunca mais!
Thamyllis Lima.
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